quinta-feira, 25 de outubro de 2012

A estrela da manhã

(o Início)

A história que vai ser narrada é recriada em parte pelo autor (parte onde existe crença do mesmo). No entanto, seja em que circunstância for, os pontos são sempre acrescentados. A história que se segue, com ou sem pontos acrescentados, é considerada por muitos mitologia, e por muitos outros verdadeira (mesmo que apenas parcialmente)...

Era uma vez uma história que aconteceu antes mesmo de se ter dado origem à História. No alto, onde nenhuma criatura viva consegue alcançar, a solidão era constante e dolorosa. E quando os planos consistem em desenvolver algo tão infinito como o universo, uma só força, mesmo sendo a força mais forte de todas, pode precisar de ajuda.

Os anjos foram criados.

Mas mais cedo, do que mais tarde, a Ciência abateu-se contra o seu Criador...tudo tem o seu oposto, e esta
é uma regra sem excepção possível. E algo sem oposto ainda visível, depressa teria de ser revelado.

- Como ousas revoltar-te contra o teu Pai? Aquele que te criou, que te ensinou o caminho?
Eras o meu filho preferido, dotado de todas as qualidades, e todas elas se revelaram mais em ti do que em qualquer outro...Porquê a ganância? Essa vontade de usurpar um trono sem lugar ou tempo
e uma coroa tão pesada quanto o poder e a responsabilidade de quem a detem.

Entre várias maldades de raíz, inalteráveis, a que mais pesou na balança foi não existir qualquer arrependimento.

O Pai beijou o filho, e sabendo que jamais o voltaria a beijar como tal, (ou pelo menos não tão cedo), em vez de um só beijo, deu dois, um do lado esquerdo da testa, outro do lado direito. O Pai expulsou o filho de casa.
Depois o universo trovejou, por um lado o alívio de quem inspira ar depois dos pulmões estarem quase a engolir uma água forçada - pois tinha-se libertado o último oposto, deixando o universo infinitamente equilibrado), por outro lado o horror, o pressentimento seguro de morte, destruição e de uma batalha colossal e sem prazo final.

A queda durou muito tempo...A velocidade da descida fez realçar as marcas deixadas por cada beijo, e aos poucos essas duas marcas transformaram-se em extremidades, duras como ossos humanos, elevando-se acima da testa por alguns centímetros. Com a temperatura negativa existente acima das nuvens e com o auxílio da velocidade, as asas, partes do corpo mais frágeis,  ficaram danificadas, o toque suave e branco foi trocado por algo duro, espigado e retorcido.
O impacto que a terra sentiu só seria igualado milhares de anos depois...a força foi tal que o corpo que caía perfurou camadas várias de solo até chegar ao calor interior do planeta. Do Branco ao gelo ao fogo.
Renascido das chamas infernais.

Era uma vez um anjo caído
por ele próprio esculpido
para se tornar na força contrária
no oposto, o escolhido e o que se escolheu,
para sempre capaz de desequilibrar o Homem
(um Homem por si só já desequilibrado)
e para ser o Seu adversário,
até que a História decida
contar uma história diferente.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Três pontos finais


- Sim...Surpreende-me. A voz soou desafiante, mas sem grande esperança.
O homem baixou os olhos de um céu que aparentemente não era dele, para voltar a caminhar na sua terra.


- Ai, a vida do mundo. Suspiraram.

O senhor começou por se queixar do estado que o país atravessava, e apesar da idade experiente, mal sabia que as coisas, em poucos meses, iriam piorar imenso. Mas a angústica não se devia aos roubos, aos enganos. A televisão era a sua única companhia e queriam tirar-lhe. Agora só sobrava a televisão, e até isso...o mundo lhe queria tirar. Começou a chorar, há mais de dois anos, ia todos os dias visitar a sua esposa. Estava a dormir num profundo coma. Era o amor da vida dele, e ali estava, como que a dormir um sono honesto, como se se estivesse a preparar para o sonho maior que é ausência da vida. Chorou, e chorou um pouco mais, chorou abertamente como se mais ninguém, tirando o alguém daquele momento, o quisesse ouvir. Não tinha mais ninguém, e a única coisa que o conseguia distrair da dor diária, estava-lhe a ser retirada...

A senhora falava por cima de uma tristeza que não era possível disfarçar. Aos poucos as lágrimas esculpiam a voz. Trabalhou tanto, ajudou tantos, e agora, tantos se tinham esquecido dela. Ainda não passava fome, mas a vida aos olhos dos inocentes é sempre pesada, e a inocência traz com ela uma verdade honesta. Ia sobrevivendo, mas onde iria tudo isto acabar? Pagava sempre as suas pequenas dívidas, que criava nos bens essenciais. Disse que ia pagando aos poucos, sempre aos poucos, e que apesar de toda esta pobreza, deste perder constante da sua dignidade, acabava sempre por pagar, custasse o que custasse. Não era mentirosa, nem enganava. E se todos fossem como ela, nada disto estaria assim.

O Homem sentou-se à porta do Banco. Existem três grandes locais onde podia pedir esmola, facto que aprendeu em pouco tempo: à porta de supermercados, bancos e igrejas. Os primeiros dias foram difíceis. Rezam as lendas do senso comum, que os dias primeiros são os piores...mas não, estão todos enganados. Depois do choque inicial, chega o peso da verdade. Da injustiça, de olhos vendados por mãos humanas; da verdadeira fome, não daquela que se tem quando se passa à frente de uma refeição ou quando não se teve tempo para comer tudo o que estava no prato; do cheiro e da sujidade que um corpo e as vestes que o cobrem são capazes de acumular...do sentimento de repulsa e ódio que conseguimos ter para connosco e para com o mundo que nos rodeia.

A mulher estava em pé, parada num parque de estacionamento. Quem observava não poderia dizer com certeza se estaria à espera de alguém, ou se o seu carro estaria ali perto. Devagar tirou um objecto do bolso, capaz de memorizar imagens. Afastou-se um pouco da parede, que mais parecia um muro, e apontou o objecto. Memorizou a imagem e enviou-a para um familiar, amigo ou para a sua outra parte. É tão raro as mulheres terem estas originalidades romanticas, não é? Pensou. Hoje não, não comigo. Sorriu e seguiu a sua vida. Nas pinturas escritas que estavam na parede, que mais parecia um muro, podia ler-se, entre outras coisas: Amo-te, em letras grossas e vermelhas.

O casal não estava vestido formalmente, apesar de ter chegado do trabalho à pouco mais de vinte minutos. Eram 19h25. Podiam ter ficado a preencher mais alguns minutos de tempo vazio nos seus locais de trabalho, mas não. Podiam ter-se estendido no sofá, mas não. Podiam ter trazido trabalho para casa, mas não, pelo menos para já. O casal estava vestido o mais simples possível, talvez até de calções ou calças de fato de treino, e de t-shirt. No campo de basquetebol, jogavam com os seus dois filhos, e aproveitam desta forma, da melhor forma, momentos que não permitiam que ninguém lhes roubasse, conscientes do seu valor impossível de quantificar.


quarta-feira, 17 de outubro de 2012

modus vivendi ( II )

O pesadelo, que já não pertence ao sono, é ainda mais medonho.
Sombras arrastam-se, (a desgraça chegou),
uma a uma estendem o braço, só osso e podridão,
tentando agarrar outras almas...O drama é o lar
desta humanidade; o sol seca
a chuva e a humidade afogam.
O sonho horrível não existe
mas este local é bem real.
A culpa dos outros verga a coluna dos inocentes,
sem alimento ou água, sem coragem, sem força,
sem dignidade. São as sombras do Homem
a assombrar as planicies desta Cidade.
O Homem detem o amuleto para abrir
a Caixa de Pandora...tal poder,
mesmo que parecendo pouco,
é capaz de destruir tudo o que à volta
do sol gira. Dor.
Enquanto existir monstruosidade
haverá sempre mais alguém
a mentir, a enganar, a roubar.
A vida é um fino fio que une duas nuvens
afastadas; e ela abana, sofre forças
vindas dos trezentos e sessenta graus possíveis,
até não aguentar mais, até não querer aguentar mais.
A compaixão foi degulada, tudo o que se consegue
ouvir é um silêncio frio.

sábado, 13 de outubro de 2012

locus horrendus ( I )

Cada gota de suor que escorrega
pelas costas é como se caisse em queda livre
numa velocidade muito lenta,
Grãos de areia, pesados e grossos
fazem com que a passagem pela ampulheta
seja extremamente dolorosa.
Este lugar não te é estranho,
Anjos algemados esperam pela decapitação
A sua esperança de estanho há muito
se rendeu a uma ilusão consciente.
Uma aura vermelha e branca
rodopia à volta do teu corpo,
tentas respira-la, absorvê-la,
mas é em vão, uma poeira cinzenta
aproxima-se, já mais próxima
compreendes que afinal é negra...
Tudo o que era certo e seguro
tudo o que era correto e aceitável
desvanesse em poucos segundos.
A realidade, tal como ela é
penetra nos poros da pele,
amostras de insanidade começam-se
a fazer notar. Estarias a dormir?
Quando acordas, depois de despertares
de mais um pesadelo, depois de despires
os lençóis suados, um arrepio
percorre os braços, o peito e a cara...
O pesadelo, que já não pertence ao sono, é ainda mais medonho.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

guilty addiction

(o Durante)

O pecado zero, o pecado
enraízado em qualquer ser humano.
- Salvei ontem para hoje me tornar
num demónio, reza a História.
Duas faces da mesma moeda...
Até que a morte da vida
desmanche uma peça
já desmanchada, e na ralidade final
possa entregar a
verdade absoluta:
Um homem só aprende com os seus erros depois de morto.
Será necessário? Havéra outra escolha?

- Eu preciso de aprender.
- Ensina-me a ensinar.
A traquilidade é tão abstracta,
numa realidade assim o silêncio
é imprevísivel, na respiração de
tambores que abalam um momento
fazendo desmanchar ainda mais
certezas e vidas já desmanchadas,
tudo se entende num enorme caos.

A interrugação aumenta a cada dia
que passa, se a maré foge livre
na procura de uma resposta
volta demasiado cedo sem a trazer,
e com ela mais perguntas
chegam...com sede.

Fogo, sombras...gelo. Luz.
Luz, fogo...gelo e sombras.
Talvez em vão...gritem; peçam só mais um instante.

sábado, 6 de outubro de 2012

a Dança da Morte


uma dança de enganos, uma dança de incertezas,
Se assim o é em vida
também o é na morte.
A melodia passeia por todos os géneros músicais,
e a dança começa a ser dançada
no momento da criação.
A vida dança com a morte, e por muito bem
que a vida dance, mais cedo ou mais tarde,
tudo acaba, e a morte continua a dançar
sozinha.
Se a sorte existir, faz companhia aqueles
que durante a dança, estão quase a errar,
e quando vão pisar os pés da morte, esta muda
de posição, e acabam por pisar apenas o chão.
Outros fazem de tudo para manter
uma concentração longíqua, mas sem a mesma sorte,
e apesar do esforço, a morte antecipa-se
ao movimento rotineiro, e faz por ser pisada. 

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Wait for Sleep



"Standing by the window
Eyes upon the moon
Hoping that the memory will leave her spirit soon

She shuts the doors and lights

And lays her body on the bed
Where images and words are running deep
She has too much pride to pull the sheets above her head
So quietly she lays and waits for sleep


She stares at the ceiling
And tries not to think
And pictures the chain
She's been trying to link again
But the feeling is gone

And water can't cover her memory

And ashes can't answer her pain
God give me the power to take breath from a breeze
And call life from a cold metal frame

In with the ashes

Or up with the smoke from the fire
With wings up in heaven
Or here, lying in bed
Palm of her hand to my head
Now and forever curled in my heart
And the heart of the world..."