sábado, 4 de agosto de 2012

o Corvo


Todas as noites caio novamente - e se me levanto
é somente para poder cair outra vez. E outra.
Porque voar alto não me chegou. Porque deveríamos beijar
o céu, se um pouco mais acima está o sol?
Cai-se, cai-se abaixo da terra, onde as chamas
queimam e ardem à inferno.
Aceitei, o que me demonstraram por tantas vezes
ser o destino que um Homem deve aceitar,
ser destruído por ele era um desafio demasiado imenso.
E não se luta - não se deve lutar - as lutas estão guardadas
para os que devem sangrar - na busca do verdadeiro alimento.
Aceitação numa luta medíocre...e mesmo nessa
falta a força de ser lutada. Fraca, hostil, esta é a minha casa.
Orgulho ou pena são em vão
numa aceitação que foi assente na escolha.
Por muito que queime - e queima sempre,
na dura ausência de um verdadeiro alimento
sobram os restos mortais de tudo o que rodeia.
Voa, mas voa muito baixo, e chega ao longe que pretende,
tão só, tão perto, da tua janela - vestido de negro
na vastidão da noite - protegendo-te dos pesadelos
mesmo quando não sabes que lá está,
sozinho no escuro - e os olhos não se movimentam
para além de ti, deitada, num descanso sereno.
E o grito é o alongar da queimadura...e o pequeno consolo
é ver-te sonhar perante este horror cravejado de trevas da realidade...
Descansa, deves estar cansada. Aqui caio, aqui grito,
daqui vejo o teu nome, por detrás do vidro.