quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Sentado ao lado de um fantasma teu

Cruzei-me com um frio
Que me fez tremer as pernas em plena cidade.
O tabaco de nada valia, servia apenas para passar o tempo,
Todo o ar que me entrava nos pulmões também era frio.
Depois de uma hora, onde o frio vinha e ia consoante o lugar
Onde estava, finalmente cheguei ao meu belo Terreiro do Paço.
É meu unicamente por que o amo e porque quando lá chego
É como se chegasse a um Oásis, é como chegar a terra firme
Depois de uma tempestade em alto mar.
Entrei então nesses vias subterrâneas que nos levam onde queremos
Em poucos minutos. Nunca apreciei a velocidade se esta não tem beleza
Em seu redor. E viajar vendo túneis não me faz feliz. Tão pouco gosto
De ver janelas quase artificiais que nos dão a ilusão de estarmos
Rodeados de ar e vento… Nunca gostei de nada ligado à claustrofobia.

Os vidros desses comboios subterrâneos são a única coisa onde encontro
Alguma graça. São espelhos enormes, com imagens cruzados de vários pontos.
E dada a falta de cor e de alternativas para quem viaja, acabamos por passar muito
Do tempo da viagem estudando rostos, olhando rostos, olhando olhos.
E numa distracção minha, devo ter fechado temporariamente os olhos,
Sentas-te a meu lado. Mas não podia ser…quais eram as probabilidades?
Só as mesmas do sol e da lua se beijarem…Mas isso já aconteceu algumas vezes desde
Que nasci… Só as mesmas de um pingo de chuva de alguma varanda, com tanto espaço
No chão e nos corpos que passam por ele, nos cair directamente na nuca...
Mas isso também me acontece e muito. Mas não podia ser. Tentei me manter calmo
E estudar-te. Virei devagar a cara e senti desde logo o teu perfume. Igual. Aquele
Aroma suave, que faz lembrar a Primavera mesmo no Inverno. A maneira como
Pegavas nos objectos que trazias contigo também era tão tua, como seguravas nas
Folhas, canetas, tudo. Mexias em tudo com a tua maneira de mexer. Nunca te captei
Os olhos, mas as sobrancelhas eram as tuas. A tua mão, não muito suave, mas perfeita,
A maneira como as tuas unhas se conjugavam com o dedo… Mas não podia ser.
Sim, claro, o nariz engraçava o ambiente. E o teu cabelo…que mais posso dizer?
Levantei-me, cheguei onde finalmente queria chegar. Ao sair, passando pelo primeiro vidro
Virei a cara e olhei-te. Não eras tu. Depois fiquei a pensar: terei mudado de perspectiva
Ou terei colocado naquela mulher as tuas características?
Saí para a rua, abrindo os abraços ao frio
Sabendo que estive sentado ao lado de um fantasma teu.