quarta-feira, 18 de novembro de 2009

A marcha dos mortos - Sinfonia da destruição (inacabamento parte três)


Queria começar por esclarecer para as mentes mais futéis, para aquelas que mais depressa se rendem à facilidade de se ser cego, que eu, distingo com alegria pessoas
que às vezes são hipócritas (não fujo à regra...quem foge?) daquelas que vivem na hipócrisia. Interrogo-me até que ponto já terão pensado nisto...mais grave ainda, interrogo-me neste momento, depois desta explicação, até que ponto terão agora compreendido...

Minha querida irmã, também eu trespasso o pórtico e entro.
Mas eu apenas o trespasso quando nele se encontra
a total ausência humana e o total silêncio...
Os meus irmãos são de sangue, os meus irmão são de amizade,
Os meus irmãos são quem amo, os meus irmãos são aqueles
que sofrem a miséria no corpo e na alma...Os seus nomes?
Ainda não sei...
O músculo da minha memória reclama por mudança.
O meu ritual? Pensar com lógica.
O meu arrependimento? Tentar aprender com o erro.
O meu perdão? Para mim próprio.
O meu ódio? É todo vosso...

Caminha o senhor padre para o altar. Na mão direita segura a cesta destinada a recolher o dinheiro para os mais pobres...a cesta quase não pesa. Na mão esquerda carrega a cesta destinada à sobrevivência, humilde, apenas para pão e àgua, da Igreja. Mas esta cesta, pesa. Pesa o fervor das massas. Pesa a alma. Pesa, em suma, toda a fé, a bondade, dos fiéis.
Que comece o ritual...
Alguns com medo do julgamento humano alheio ajoelham-se. Os mais próximo do senhor padre nem sequer hesitam. E alguns, mas só alguns, cientes do seu potencial tamanho mantêm-se em pé. Este teatro, perdoem-me a honestidade mais pura, revolta-me. Revolta-me? Revolta-me.

Agora chega o momento de louvar ao Senhor. Todos cantam. Os que desafinam são olhados de lado. Os que não sabem a letra da música fingem cantar, para não serem julgados. E as crianças cantam por terem sido obrigadas a cantar.


Minha querida irmã, também eu consigo observar com nitidez as estátuas e personagens que me olham das paredes. Cobertas com o seu véu de mentiras.

Escolheu Jesus para seu copo, um objecto de madeira...
Mas não chega ao homem algo tão severamente simples,
Não!, o homem precisa de ser mais,
O homem precisa de ouro...
Na simplicidade da mensagem divina
Vocês preferem criar uma mentira tão complexa...
Tão pesada. Tão rica...
Por rica entenda-se vazia. Falta de preenchimento.

As aparências. O julgamento. Tudo diferente do que deveria ser.
Meus "irmãos"...continuamos a caminhar em sentidos opostos...
Meus "irmãos"...Como posso eu amar alguém que apenas finge amar,
Alguém que grita aos céus pela vida miserável que carrega?
Como posso amar quem é quem não quer ser?
Como conseguem vocês viver nessa ilusão que nem sequer
vos agrada?

Continua a mesma marcha de mortos nestas ruas do mundo...
Frustrados de fé, angustiados pelo sabor da hóstia,
O vosso ser repudia o excesso de viver
que se debate com a força de se manterem iguais.

O senhor padre segura no ar o pão,
E na fome dos que já não aguentam,
Solta-se um suspiro,
Entra um anjo pela porta principal,
E sem ninguém o ver, ajoelha-se,
Reza por força para o dia do Juízo Final.
O dia está belo e sem nuvens, apenas se sente o sol,
Dentro das almas mais cegas ruge um trovão...
Mas não passou de uma luz fraca, dada a escuridão...
Erguem-se os exércitos sem inspiração,
Pequenos seres vivos sem ritmo numa música de tambores
sem canção, um hino aos esqueletos que fingem caminhar neste mundo.
Que comece a sinfonia da destruição...

(texto a bold : Joana Garcia, http://memoriasrasgadas.blogspot.com/2009/10/recado.html . Obrigado!)

1 comentário:

Joana disse...

Lindo...Verdadeiramente inspirador.
E já agora, eu entrei lá com pessoas para dar o recado. :)
"Por rica entenda-se vazia. Falta de preenchimento." Amei. Como sempre, embora tenha gostado mais do um. *
Keep going